Foi aí então que Arjuna pôde ver, no meio dos exércitos de ambos os grupos, seus pais, avós, mestres, tios maternos, irmãos, filhos, netos, amigos e também seus sogros e benquerentes.
Ao ver todas essas diferentes categorias de amigos e parentes, Arjuna, ficou dominado pela compaixão e falou as seguintes palavras.
"Meu querido Krishna, vendo diante de mim meus amigos e parentes com tal espírito belicoso, sinto os membros do meu corpo tremer e minha boca secar."
Qualquer um que tenha devoção genuína ao Senhor, apresenta todas as boas qualidades que são encontradas em pessoas piedosas ou nos semideuses, ao passo que o não-devoto, cuja educação e cultura talvez lhe propiciem tantas qualificações materiais, carece de qualidades piedosas. É por isso que Arjuna, logo após ver seus familiares, amigos e parentes no campo de batalha, sentiu imediatamente muita compaixão por essas pessoas que haviam decidido lutar entre si. Quanto a seus soldados, ele ficou enternecido desde o começo, mas sentia compaixão até mesmo pelos soldados do grupo oposto, prevendo-lhes a morte iminente. E enquanto mergulhava nesses pensamentos, os membros de seu corpo começaram a tremer e sua boca ficou seca. Sentiu-se um pouco atônito ao ver-lhes o espírito belicoso. Praticamente toda a comunidade, e todos eles parentes consanguíneos de Arjuna, veio lutar com ele. Isto oprimia um devoto bondoso como Arjuna. Embora não se mencione aqui, facilmente pode-se imaginar que não só os membros do corpo de Arjuna tremiam e sua boca secara, mas ele também derramava lágrimas de compaixão. Tais sintomas presentes em Arjuna não se deviam à fraqueza, mas à sua afabilidade, uma característica do devoto puro do Senhor. Portanto, está dito:
“A pessoa que sente devoção inabalável pela Personalidade de Deus tem todas as boas qualidades dos semideuses. Mas quem não é devoto do Senhor tem apenas qualificações materiais que são de pouco valor. Isto ocorre porque ele paira no plano mental e com certeza se deixará atrair pelo brilho da energia material.” (Bhāg. 5.18.12)
E Arjuna continuo dizendo:
"O meu corpo está todo tremendo, meus pêlos estão arrepiados, meu arco Gändīva está escorregando da minha mão e minha pele está ardendo."
"Já não tenho mais capacidade de continuar aqui. Estou esquecendo-me de mim mesmo e minha mente está girando. Eu só vejo motivo para o infortúnio, ó Krishna."
"Não consigo ver qual o bem que decorreria da morte de meus próprios parentes nesta batalha, nem posso eu, meu querido Krishna, desejar vitória alguma, reino ou felicidade subseqüentes."
Há duas espécies de tremor do corpo e duas espécies de arrepio dos pêlos. Tais fenômenos acontecem quando se sente grande êxtase Espiritual ou quando se experimenta grande medo em condições materiais. Na plataforma transcendental, não há medo. Os sintomas que Arjuna manifestou nesta situação são devidos ao medo material — a saber, perda da vida. Isto é evidenciado por outros sintomas também; ele ficou tão abalado que seu famoso arco Gändīva estava escorregando de suas mãos, e, porque seu coração ardia dentro dele, ele tinha a impressão de que sua pele estava queimando. Tudo isto se deve a uma concepção de vida material.
Devido à sua inquietação, Arjuna era incapaz de permanecer no campo de batalha, e estava esquecendo-se de si mesmo por causa desta fraqueza de sua mente. Apego excessivo a coisas materiais deixa o homem ficar nessa situação existencial confusa, este temor e esta perda de equilíbrio mental acontecem a pessoas que estão muito afetadas pelas condições materiais. Arjuna previa apenas dolorosos reveses no campo de batalha — e ele não ficaria feliz nem mesmo se derrotasse o inimigo. Ao ver apenas frustrações em suas expectativas, a pessoa pensa: “Por que estou aqui?” Cada qual está interessado em si mesmo e em seu próprio bem-estar. Ninguém está interessado no Eu Supremo. Pela vontade de Krishna, Arjuna mostra ignorância de seu verdadeiro interesse. Nosso verdadeiro interesse está em Vishnu, ou Krishna. A alma condicionada esquece-se disto e por conseguinte sofre dores materiais. Arjuna pensava que sua vitória na batalha seria apenas causa de lamentação.
Sem saber que seu próprio interesse está em Vishnu (ou Krishna), as almas condicionadas deixam-se atrair pelas relações corpóreas, esperando ser felizes nessas situações. Nessa concepção cega de vida, elas chegam mesmo a esquecer as causas da felicidade material. Arjuna parece até ter-se esquecido dos códigos morais próprios dos Guereiros Kshatriyas. Diz-se que duas classes de homens, a saber, o Kshatruya que morre diretamente no campo de batalha sob as ordens pessoais de Krishna e a pessoa na ordem de vida renunciada que se dedicou por completo à cultura Espiritual, estão qualificadas para entrar no globo solar, que é tão poderoso e ofuscante. Se Arjuna reluta até mesmo em matar seus inimigos, muito menos iria ele matar seus parentes! Ele acha que, matando seus parentes, não haverá felicidade em sua vida, e portanto não quer lutar, assim como se alguém não sente fome, não está inclinado a cozinhar. Ele decidiu ir para a floresta, onde, cheio de frustrações, ficaria recluso. Mas como Kshatriya, ele precisa de um reino para a sua subsistência, porque os Kshatriyas não podem envolver-se em nenhuma outra ocupação. Mas Arjuna não tem reino algum. Para Arjuna, a única oportunidade de obter um reino será em lutar com seus primos e irmãos e recuperar o reino herdado de seu pai, mas isto ele não quer fazer. Portanto, ele se considera apto a ir para a floresta, onde se recolheria para viver de suas frustrações.
Arjuna continua expressando sua lamentação dizendo:
"Ó Krishna Govinda, que nos adiantam um reino, felicidade ou até mesmo a própria vida quando todos aqueles em razão de quem somos impelidos a desejar tudo isto estão agora enfileirados neste campo de batalha? Ó Krishna, quando mestres, pais, filhos, avós, tios maternos, sogros, netos, cunhados e outros parentes estão prontos a abandonar suas vidas e propriedades e colocam-se diante de mim, por que deveria eu querer matá-los, mesmo que, por sua parte, eles sejam capazes de matar-me? Ó mantenedor de todas as entidades vivas, não estou preparado para lutar com eles, nem mesmo em troca dos três mundos, muito menos desta Terra. Que prazer obteremos em matarmos todos que aqui se encontram? O pecado nos dominará se matarmos tais agressores. Portanto, não convém matarmos os filhos de nossos amigos. Que ganharíamos, ó Krishna, esposo da deusa da fortuna, e como poderíamos ser felizes, matando também nossos próprios parentes? Ó Krishna, embora estes homens, com seus corações dominados pela cobiça, não achem errado matar a própria família ou brigar com os amigos, por que deveríamos nós, que entendemos ser crime destruir uma família, ocupar-nos nestes atos pecaminosos?"
Arjuna tratou o Senhor Krishna por Govinda porque Krishna é o objeto de todos os prazeres para as vacas e os sentidos. Usando esta palavra significativa, Arjuna indica que Krishna deve procurar entender o que satisfará os sentidos de Arjuna. Mas Govinda não Se destina a satisfazer nossos sentidos. Entretanto, se tentamos satisfazer os sentidos de Govinda, então, automaticamente nossos próprios sentidos ficam satisfeitos. Materialmente, cada um quer satisfazer os seus sentidos, e quer que Deus aja de modo que esta exigência se realize. O Senhor satisfará os sentidos das entidades vivas tanto quanto elas mereçam, mas não na extensão de sua cobiça. Mas quando se toma o caminho oposto — a saber, quando alguém tenta satisfazer os sentidos de Govinda sem desejar satisfazer seus próprios sentidos — então, pela graça de Govinda, todos os desejos da entidade viva são satisfeitos. A profunda afeição que Arjuna sentia pela comunidade e pelos membros da família manifestou-se aqui em parte devido à sua natural compaixão por eles. Portanto, ele não está preparado para lutar. Todos querem mostrar sua opulência aos amigos e aos parentes, mas Arjuna receia que, como todos os seus parentes e amigos morrerão no campo de batalha, ele será incapaz de compartilhar sua opulência após a vitória. Este é um procedimento típico da vida material. No entanto, a vida transcendental é diferente. Como quer satisfazer os desejos do Senhor, o devoto pode, se for esta a vontade de Deus, aceitar todos os tipos de opulência para servir ao Senhor, e se não for esta a vontade do Senhor, ele não deve aceitar nem mesmo um centavo. Arjuna não desejava matar seus parentes, e se houvesse alguma necessidade de matá-los, ele preferia que Krishna os matasse pessoalmente. Nessa altura, ele não sabia que Krishna já os havia matado antes de eles irem para o campo de batalha e que ele devia apenas tornar-se um instrumento de Krishna. Este fato é revelado nos capítulos seguintes. Como era por natureza um devoto do Senhor, Arjuna não gostava de retaliar seus primos e irmãos infames, mas de acordo com o plano do Senhor todos eles deveriam ser mortos. O devoto do Senhor não revida o malfeitor, mas o Senhor não tolera nenhum malefício que um descrente pratique contra o devoto. O Senhor pode desculpar alguém por Sua própria conta, mas Ele não desculpa ninguém que tenha causado danos a Seus devotos. Por isso, o Senhor estava determinado a matar os descrentes, embora Arjuna quisesse desculpá-los.
Não se espera que um Kshatriya recuse-se a combater ou a jogar quando algum rival lhe faz esse convite. Sob tal premência, Arjuna não podia recusar-se a lutar, porque tinha sido desafiado pelo grupo oposto onde se encontravam todos os seus parentes e amigos. Em relação a isto, Arjuna considerou que o outro grupo devia estar cego aos efeitos de tal desafio. Arjuna, no entanto, podia ver as conseqüências funestas e não podia aceitar o desafio. A obrigação é de fato imperiosa quando o efeito é bom, mas quando o efeito é outro, então ninguém pode sentir-se na obrigação de agir. Considerando todos esses prós e contras, Arjuna decidiu não lutar.
Segundo os preceitos védicos, há seis classes de agressores: (1) aquele que ministra veneno; (2) aquele que ateia fogo a uma casa; (3) aquele que ataca com armas mortais; (4) aquele que saqueia bens; (5) aquele que ocupa a terra de outrem; e (6) aquele que rapta uma esposa. Tais agressores devem ser mortos imediatamente, e não se incorre em pecado matando tais agressores. Semelhante extermínio de agressores condiz muito bem com qualquer homem comum, mas Arjuna não era uma pessoa comum. Seu caráter era santo, e portanto, diante deles, queria portar-se com santidade. Todavia, esta espécie de santidade não é para um Kshatriya. Embora um homem responsável encarregado da administração de um Estado precise ser santo, ele não deve ser covarde. Por exemplo, o Senhor Rāma era tão santo que até agora as pessoas anseiam por viver no reino do Senhor Rāma, mas o Senhor Rāma jamais mostrou nenhuma covardia. Porque raptou Sītā, a esposa de Rāma, Rāvaṇa foi um agressor contra Rāma, mas o Senhor Rāma deu-lhe muitas lições sem paralelo na história do mundo. Contudo, no caso de Arjuna, deve-se considerar o tipo especial de agressores, que são seu próprio avô, seu próprio mestre, amigos, filhos, netos, etc. Por causa deles, Arjuna pensou que não deveria tomar as medidas severas que são necessárias contra agressores comuns. Além disso, as pessoas santas são aconselhadas a perdoar. Tais preceitos válidos para as pessoas santas são mais importantes que qualquer emergência política. Arjuna considerava que, em vez de ater-se a razões políticas que o induziriam a matar seus próprios parentes, seria melhor perdoá-los baseado em religião e comportamento santo. Portanto, ele não considerou lucrativa uma matança que lhe propiciaria apenas felicidade corpórea temporária. Afinal de contas, os reinos e prazeres posteriormente granjeados não são permanentes, então, por que deveria ele arriscar sua vida e salvação eterna matando seus próprios parentes? O fato de Arjuna tratar Krishna de como sendo o esposo da deusa da fortuna, também é importante neste contexto. Ele queria indicar a Krishna que, como esposo da deusa da fortuna, Ele não devia induzir Arjuna a assumir um encargo que acabaria produzindo infortúnio. Krishna, porém, jamais traz infortúnio a ninguém, muito menos a Seus devotos.
Vendo Arjuna compadecido por todos que ali se encontravam no meio dos dois exércitos, Krishna sorriu e disse as seguintes palavras ao desconsolado Arjuna:
"Meu querido Arjuna, como foi que tais impurezas desenvolveram-se em você? Elas não condizem com um homem que conhece o valor da vida. Elas não conduzem aos planetas superiores, mas à infâmia. Ao falar palavras cultas, você está lamentando pelo que não é digno de pesar. Sábios são aqueles que não se lamentam nem pelos vivos nem pelos mortos. Nunca houve um tempo em que Eu não existisse, nem você, nem todos esses reis; e no futuro nenhum de nós deixará de existir. Assim como a alma encarnada passa seguidamente, neste corpo, da infância à juventude e à velhice, da mesma maneira, a alma passa para um outro corpo após a morte. Uma pessoa sóbria não se confunde com tal mudança. O aparecimento temporário da felicidade e da aflição, e o seu desaparecimento no devido tempo, são como o aparecimento e o desaparecimento das estações de inverno e verão. Eles surgem da percepção sensorial, portanto precisa-se aprender a tolerá-los sem se perturbar. Quem não se deixa perturbar pela felicidade ou aflição e permanece estável em ambas as circunstâncias, está certamente qualificada para a liberação. Aqueles que são videntes da verdade concluíram que não há continuidade para o inexistente ( o corpo material ) e que não há interrupção para o existente (a alma) . Eles concluíram isto estudando a natureza de ambos. Saiba que aquilo que penetra o corpo inteiro é indestrutível. Ninguém é capaz de destruir a alma imperecível. O corpo material da entidade viva indestrutível, imensurável e eterna decerto chegará ao fim; portanto, lute.
Aquele que pensa que a entidade viva é o matador e aquele que pensa que ela é morta não estão em conhecimento, pois o eu não mata nem é morto.
Para a alma, em tempo algum existe nascimento ou morte. Ela não passou a existir, não passa a existir e nem passará a existir. Ela é não nascida, eterna, sempre-existente e primordial. Ela não morre quando o corpo morre.
Como pode uma pessoa que sabe que a alma é indestrutível, eterna, não nascida e imutável matar alguém ou fazer com que alguém mate?
Assim como alguém veste roupas novas, abandonando as antigas, a alma aceita novos corpos materiais, abandonando os velhos
e inúteis.
A alma nunca pode ser cortada em pedaços por arma alguma, nem pode ser queimada pelo fogo, ou umedecida pela água ou definhada pelo vento.
Esta alma individual é inquebrável e indissolúvel, e não pode ser queimada nem seca. Ela é permanente, está presente em toda a parte, é imutável, imóvel e eternamente a mesma.
Diz-se que a alma é invisível, inconcebível e imutável. Sabendo disto, você não deve se afligir por causa do corpo.
Se, no entanto, você pensa que a alma [ou os sintomas de vida] sempre nasce e morre para sempre, ainda assim, voce não tem razão para lamentar, ó pessoa de braços poderosos.
Para aquele que nasce a morte é certa, e após a morte ele voltará a nascer. Portanto, no inevitável cumprimento de seu dever, você não deve se lamentar.
Todos os seres criados são imanifestos no seu começo, manifestos no seu estado intermediário, e de novo imanifestos quando aniquilados. Então, qual a necessidade de lamentação?
Alguns consideram a alma como supreendente, outros descrevem-na como surpreendente, e alguns ouvem dizer que ela é surpreendente, enquanto outros, mesmo após ouvir sobre ela, não podem absolutamente compreendê-la.
Aquele que mora no corpo nunca pode ser morto. Portanto, você não precisa afligir-se por nenhum ser vivo.
Considerando seu dever específico de kshatriya, você deve saber que não há melhor ocupação para você do que lutar conforme determinam os princípios religiosos; e assim não há necessidade de hesitação.
Felizes são os kshatriyas a quem aparece esta oportunidade de lutar, abrindo-lhes as portas dos planetas celestiais.
Se, contudo, você não executar seu dever religioso e não lutar, então na certa incorrerá em pecados por negligenciar seus deveres e assim perderá sua reputação de lutador.
As pessoas sempre falarão de sua infâmia, e para alguém respeitável, a desonra é pior do que a morte.
Os grandes generais que têm na mais alta estima o seu nome e fama pensarão que você deixou o campo de batalha simplesmente porque estava com medo, e portanto irão considerá-lo insignificante.
Seus inimigos irão descrevê-lo com muitas palavras indelicadas e desdenharão sua habilidade. Que poderia ser mais doloroso
para você?
Ou você será morto no campo de batalha e alcançará os planetas celestiais, ou conquistará e gozará o reino terrestre. Portanto, levante-se com determinação e lute.
Lute pelo simples fato de lutar, sem levar em consideração felicidade ou aflição, perda ou ganho, vitória ou derrota — e, adotando este procedimento, você nunca incorrerá em pecado.
Até agora, descrevi este conhecimento a você através do estudo analítico. Ouça agora enquanto eu o explico em termos de trabalho sem resultados fruitivos. Quando você agir segundo este conhecimento, poderá livrar-se do cativeiro decorrente das ações.
Neste esforço, não há perda nem diminuição, e um pequeno progresso neste caminho pode proteger a pessoa do mais perigoso tipo de medo.
Aqueles que estão neste caminho são resolutos, e têm um só objetivo. A inteligência daqueles que são irresolutos tem muitas ramificações.
Os homens de pouco conhecimento estão muitíssimo apegados às palavras floridas dos Vedas, que recomendam várias atividades fruitivas àqueles que desejam elevar-se aos planetas celestiais, com o conseqüente bom nascimento, poder e assim por diante. Por estarem ávidos em satisfazer os sentidos e ter uma vida opulenta, eles dizem que isto é tudo o que importa.
Nas mentes daqueles que estão muito apegados à gratificação dos sentidos e à opulência material, e que se deixam confundir por estas coisas, não ocorre a determinação resoluta de prestar serviço devocional ao Senhor Supremo.
Os Vedas tratam principalmente do tema dos três modos da natureza material. Ó Arjuna, torne-se transcendental a estes três modos. Liberte-se de todas as dualidades e de todos os anseios advindos da busca de lucro e segurança e estabeleça-se no eu.
Todos os propósitos satisfeitos por um poço pequeno podem imediatamente ser satisfeitos por um grande reservatório de água. De modo semelhante, todos os propósitos dos Vedas podem ser cumpridos por aquele que conhece o seu propósito subjacente.
Você tem o direito de executar seu dever prescrito, mas não tem o direito aos frutos da ação. Jamais se considere a causa dos resultados de suas atividades, e jamais se apegue ao não-cumprimento do seu dever.
Desempenhe seu dever com equilíbrio, ó Arjuna, abandonando todo o apego a sucesso ou fracasso. Tal equanimidade chama-se yoga.
Mantenha todas as atividades abomináveis bem distantes através da prática do serviço devocional, e nesta consciência renda-se ao Senhor. Aqueles que querem gozar o fruto de seu trabalho são mesquinhos.
Aquele que está ocupado no serviço devocional, livra-se tanto das boas quanto das más ações, mesmo durante esta vida. Portanto, empenhe-se na yoga, que é a arte de todo o trabalho.
Ocupando-se no serviço devocional ao Senhor, grandes sábios ou devotos livram-se dos resultados de trabalho no mundo material. Agindo assim, eles ficam livres do ciclo de nascimento e morte, e passam a viver além de todas as misérias (indo de volta ao Supremo).
Quando sua inteligência superar a densa floresta da ilusão, você se tornará indiferente a tudo o que foi ouvido e a tudo o que se há de ouvir.
Quando sua mente deixar de perturbar-se pela linguagem florida dos Vedas, e quando se fixar no transe da auto-realização, você então terá atingido a consciência divina.
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Arjuna indagou a Krishna a seguinte dúvida:
Ó Krishna, quais são os sintomas daquele cuja consciência está absorta nessa transcendência? Como ele fala, e qual é sua linguagem? Como ele se senta e como ele caminha?
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A Suprema Personalidade de Deus Krishna então disse:
"Quando alguém desiste de todas as variedades de desejo para o prazer dos sentidos, os quais surgem da trama mental, e quando a sua mente, assim purificada, encontra satisfação apenas no eu, então, diz-se que ele está em consciência transcendental pura.
Aquele cuja mente não é perturbada mesmo estando rodeado das três classes de misérias, e nem se exalta quando há felicidade, e que está livre do apego, do medo e da ira, é chamado um sábio de mente estável.
No mundo material, quem não se deixa afetar pelo bem nem pelo mal que venha a obter, sem louvá-lo nem desprezá-lo, está firmemente fixo em conhecimento perfeito.
Aquele que é capaz de retirar seus sentidos dos objetos dos sentidos, assim como a tartaruga recolhe seus membros para dentro do casco, está firmemente fixo em consciência perfeita.
A alma encarnada pode restringir-se do prazer dos sentidos, embora o gosto pelos objetos dos sentidos permaneça. Porém, interrompendo tais ocupações ao experimentar um gosto superior, ela fixa-se em consciência.
Os sentidos são tão fortes e impetuosos, ó Arjuna, que arrebatam à força até mesmo a mente de um homem de discriminação que se esforça por controlá-los.
Aquele que restringe seus sentidos, mantendo-os sob completo controle, e fixa sua consciência em Mim, é conhecido como um homem de inteligência estável.
Enquanto contempla os objetos dos sentidos, a pessoa desenvolve apego a eles, e de tal apego se desenvolve a luxúria, e da luxúria surge a ira.
Da ira, surge completa ilusão, e da ilusão, a confusão da memória. Quando a memória está confusa, perde-se a inteligência, e ao perder a inteligência, cai-se de novo no poço material.
Aquele que livre de todo apego e aversão é capaz de controlar seus sentidos através dos princípios regulativos da liberdade pode obter a misericórdia completa do Senhor.
Para alguém assim satisfeito (na consciência de Krishna), as três classes de misérias da existência material deixam de existir; nesta consciência jubilosa, a inteligência logo se torna resoluta.
Quem não está vinculado ao Supremo (em consciência de Krishna) não pode ter inteligência transcendental nem mente estável, sem as quais não há possibilidade de paz. E como pode haver alguma felicidade sem paz?
Assim como um barco na água é arrastado por um vento forte, até mesmo um só dos sentidos errantes em que a mente se concentre pode arrebatar a inteligência do homem.
Portanto, o indivíduo cujos sentidos são restringidos de seus objetos com certeza tem uma inteligência estável.
O que é noite para todos os seres é a hora de despertar para o autocontrolado; e a hora de despertar para todos os seres é noite para o sábio introspectivo.
Aquele que não se perturba com o incessante fluxo dos desejos — que entram como os rios no oceano, o qual está sempre sendo enchido mas sempre permanece calmo — pode alcançar a paz, e não o homem que se esforça para satisfazer tais desejos.
Aquele que abandonou todos os desejos para o prazer dos sentidos, que vive livre de desejos, que abandonou todo o sentimento de propriedade e não tem falso ego — só ele pode conseguir a verdadeira paz.
Este é o caminho de uma vida Espiritual e piedosa, e o homem que a alcança não se confunde. Se ele atingir esta posição, mesmo que somente à hora da morte, poderá entrar no reino de Deus.
Resumo do Bhagavad-Gītä capitulos 1, e 2.